25 de abril de 2017

Reforma do Ensino Médio divide opiniões em Sergipe

Por Pedro Nascimento

Presidente Michel Temer sanciona Lei da Reforma do Ensino Médio (foto: Marcos Corrêa/PR) 


Desde que o governo Temer apresentou, em setembro de 2016, a Medida Provisória 746/2016 para a Reforma do Ensino Médio, o assunto vem sendo propagado pelos veículos de comunicação e, principalmente, abordado na web entre os próprios internautas. Pessoas contra, a favor e outras confusas em relação ao que foi proposto para a Reforma.

Mas, após tantas polêmicas, no dia 16 de fevereiro o Presidente Michel Temer sancionou a Lei que reforma o Ensino Médio.

A proposta, que foi aprovada pelo Congresso Nacional, prevê que a partir de 2019 a carga horária do Ensino Médio irá aumentar e a grade será mais flexível contendo matérias obrigatórias e optativas.

O texto aprovado determina que as escolas terão um prazo de 5 anos para aumentar a carga horária do Ensino Médio para 1.000 horas anuais, sendo assim, os alunos passarão a ter 5 horas diárias de aula. A meta ainda é aumentar, de forma gradual, para 1.400 mil horas para que ensino seja implantado totalmente de forma integral.

Quanto à flexibilidade da grade curricular, a Lei estabelece que 60% dela será obrigatória e composta por Português, Matemática, Artes e Educação Física. Já os 40% restantes serão definidos segundo a proposta da escola e escolhidos pelos estudantes conforme a formação profissional desejada. Para compor os 40% o colégio poderá oferecer disciplinas nas áreas de Linguagens, Matemática e suas Tecnologias, Ciências da Natureza, Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, além de Formação Técnica e Profissional.

Segundo o Ministério da Educação (MEC), a reforma do Ensino Médio se dá pela realidade trágica do ensino no país, e que essas modificações já vinham sendo discutidas há anos, o que contribuiu para que o governo pudesse acelerar ainda mais as mudanças.

Seguindo na corrente contraria, a União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes), diz que a nova proposta desvaloriza o pensamento crítico do estudante. "A reforma propõe uma formação tecnicista, mecânica, que se dedica apenas a atender as demandas do mercado e não compactua com o desenvolvimento de indivíduos pensantes, cidadãos preparados para a vida e para a diversidade típica do país", justifica.

Mudanças: escolas particulares X escolas públicas

Em Sergipe, alguns coordenadores de escolas públicas foram procurados mas não puderam comentar sobre a reforma do Ensino Médio. Uma fonte revelou que alguns, de certa forma, acabam sendo censurados por serem de cargos indicados, o que possivelmente pode levá-los a perder o emprego. Mas em conversa Manoel Junior, 37 anos, Coordenador do 3º ano do Ensino Médio de uma escola particular de Aracaju, no bairro Siqueira Campos, vê como positiva essa reforma do governo, mas que será um desafio para o estudante brasileiro se adaptar a todas essas mudanças a curto prazo. Ele acha que é preciso haver um preparo cultural.

"Eu vejo com bons olhos, porque é necessário que o aluno tenha um conhecimento básico e que ele busque de fato um aprofundamento em áreas específicas, de acordo com o grau de interesse dele, pelo menos um núcleo comum. Essa primeira geração de alunos que receberão o impacto dessas transformações, será um público que terá maior dificuldade de adaptação", comenta. Ele ainda considera que, mesmo com esse desafio que o aluno vai ter, há benefícios.

"Quando você direciona o estudo para o aluno, isso possibilita que a aula se torne mais prazerosa e quando a gente fala no prazer a gente está trabalhando com toda uma matriz de competências e habilidades que é específica do público discente. Então depende muito do aluno e da área que ele quer seguir".

Com todas essas mudanças as escolas também precisarão enfrentar alguns desafios para se adaptar ao novo Ensino Médio. Segundo Manoel, a escola precisará capacitar os professores para que eles estejam preparados para a nova realidade, além de melhorar a infraestrutura do colégio para receber o aluno em tempo integral, colaborando para que esse aluno possa aprofundar seus estudos com o auxílio de laboratórios, por exemplo.

Para o Coordenador, o que pode atrapalhar a implantação desse modelo é o custo de todas as modificações que serão necessárias. "Querendo ou não, nós ainda estamos passando por uma crise econômica no país. Estamos começando a engatinhar para sair dela, só que essa crise ainda tende a se arrastar por um tempo, então como falar em aumento de despesas na escola e aumento de mensalidade?", declara. Manoel acredita que será mais prático a implantação do novo modelo de ensino nas escolas públicas, pois as particulares irão demorar alguns anos para atingir esse objetivo.

O Sergipano e as incertezas

A reforma vale para escolas públicas e particulares, mas os investimentos que o governo federal vai fazer será nas escolas públicas, onde a previsão é que sejam injetados R$ 1,5 bilhão até 2018. Segundo o Senado, esse dinheiro será usado para "o aperfeiçoamento dos profissionais de educação; para compra, reforma e conservação de instalações; para o uso e manutenção de bens e serviços; para atividades-meio e para a compra de material didático e custeio de transporte escolar".

A professora de Educação Física Dansilvia Oliveira, 52, acha que a flexibilização da grade curricular é excludente, pois limita o conhecimento do aluno e, consequentemente, a implantação do tempo integral vai atrapalhar os estudantes que precisam trabalhar, fazendo com que obrigue o aluno a abandonar as aulas. "A gente entende que o estudante de escola pública é um aluno trabalhador, e o aluno que é trabalhador não vai ter como ficar 4, 5 anos no Ensino Médio. Ele vai desistir. Então é uma forma, que eu vejo, de também brecar o acesso do aluno das classes populares ao ensino e, por conseguinte, ao ensino superior, porque é o tipo de aluno que ele vai num determinado momento evadir da escola", avalia.

Além disso, Dansilvia - que há 31 anos ensina em escolas públicas - diz que toda essa modificação da grade curricular poderá prejudicar os professores de diversas áreas. "Na medida em que essas disciplinas vão sendo aos poucos excluídas no ano que os alunos estudam, evidentemente que vai ter professores que estarão à disposição e no futuro breve demitidos. Isso também com qualquer outra disciplina, não somente com Educação Física. E não vai só afetar os professores que estão atuando, vai afetar inclusive todos os cursos de licenciatura, porque na medida que determinadas disciplinas vão sendo optativas e terão sua carga horária reduzida, é lógico que no futuro bem próximo não haverá demanda para que absorva professores para atuarem, sem contar a previsão do ensino pelo notório saber. Então é uma total desvalorização do magistério como um todo".

Para o professor de Geografia Richardson Batalha, 36, os docentes da área em que ele atua não serão afetados pelas alterações que serão realizadas com a implantação do novo Ensino Médio. "Dentro dessa flexibilização o que vai acontecer é que se a carga horária naquela escola não irá aportar Geografia de uma forma plena, o professor vai ser encaminhado para outra escola para complementar a carga horária, e isso na realidade já acontece", analisa.

Richardson acha que essa flexibilidade curricular será positiva para o aluno pelo fato de que o estudante poderá optar por áreas do conhecimento que ele possui mais afinidade, assim tendo uma maior habilidade e desenvolvimento intelectual. Mas ele ressalta que também há riscos. "O jovem em si ele pode não ter maturidade suficiente para escolher qual será no futuro a sua profissão. Em contrapartida, eu acho que dentro desses riscos o próprio governo deveria implementar profissionais encarregados de desenvolver nesses alunos um processo avaliativo, para que eles pudessem de fato ao longo do ensino médio desenvolverem qual realmente a área ou a profissão que eles irão seguir".

Victor Mendonça, 17, calouro do curso Design Gráfico da Universidade Federal de Sergipe, acha que o maior desafio dos alunos que irão passar por essa nova fase do Ensino Médio será de fazer a escolha de qual área pretende seguir profissionalmente. "Iniciei meu Ensino Médio sem conhecer vários cursos e apenas decidi qual iria fazer no 3° ano. Então acho que será uma responsabilidade enorme na mão de jovens muito novos que muitas vezes só conhecem profissões que seus pais indicam". Victor vê a reformulação de forma positiva até determinado ponto. Para ele, é muito interessante aprofundar os conhecimentos em áreas específicas, mas sem deixar de ter uma boa base em todas as outras - já que cada uma tem sua importância.

O estudante de Ciência da Computação José Oliveira, 21, acha a reforma válida, mas ressalva que é preciso ver seu andamento para melhor opinar. Com as informações já disponíveis, há algo aproveitável em toda essa reformulação. "Creio que o maior desafio será de o aluno se adequar ao tempo de aula integral para aqueles que estudam somente em um turno. De resto, creio que será confuso para alguns o funcionamento das disciplinas".


A publicidade das informações e seus receptores

Desde que a Medida Provisória chegou a conhecimento da população, o governo federal vem gastando milhões de reais dos cofres públicos  na veiculação de propaganda da reforma do Ensino Médio nos canais de televisão de todo o país. Segundo o site Quanto Custa, para anunciar por apenas 30 segundos no intervalo da novela das 21h, da Rede Globo, é preciso desembolsar R$ 715.100,00.

Além da TV, o governo vem investindo em propagandas no rádio e na internet, dois outros meios de comunicação que possuem muitos receptores.

Foto: reprodução/YouTube

Na edição de 17 de Fevereiro de 2017, a Folha de São Paulo publicou uma reportagem falando sobre o pagamento de R$ 65 mil reais feito pelo governo para o canal "Você Sabia" - que conta com mais de 7,1 milhões de inscritos no YouTube. O dinheiro foi usado para que os dois vlogueiros do canal - Lukas Marques e Daniel Molo - falassem bem sobre a reforma num vídeo intitulado de "Tudo que você precisa saber sobre o novo Ensino Médio!!". No vídeo, da forma mais natural possível, os dois jovens explicam os benefícios da nova reforma sem deixar transparecer em nenhum momento que o vídeo é um publieditorial. Ainda segundo a Folha, o MEC informou que outros cinco canais do YouTube foram contratados, o que significou um custo total de R$ 295 mil reais. A reportagem da Folha ainda apurou que outros dois canais foram procurados, mas não aceitaram a proposta.

A jovem Sofia Freira, 12, estudante do 8º ano, explica que ficou sabendo da reforma do Ensino Médio através dos jornais e porque a família dela comenta bastante sobre o assunto em casa. Sofia, que sonha em ser uma Juíza, contou que os professores também já conversaram com os alunos da turma em que ela estuda. Eles explicaram como serão as mudanças e opinaram a respeito. Assim, ela chegou à conclusão de que a reformulação será uma boa medida, mas acha que não vai funcionar tão bem devido à cultura dos alunos da atual sociedade. Sofia disse que sua mãe também concorda que essas mudanças do Ensino Médio não serão tão boas assim como vem sendo repercutido. "Por exemplo, nós temos um aluno que vai escolher estudar tais matérias, mas se ele no futuro decidir que não era aquilo que ele queria pra vida dele, ele não terá mais condições para voltar atrás. Ele terá que recomeçar tudo de novo e isso poderá prejudicar alguns alunos no futuro. Então, ela também concorda com essa opinião de que talvez não dê muito certo", relata.

Pedro Felipe, 15, aluno do 8º ano, revela não estar tão informado sobre a flexibilidade da grade curricular, mas que ficou sabendo - através da televisão - sobre o MédioTec, programa do governo que é destinado a ofertar formação técnica e profissional a estudantes do ensino médio. Pedro, que pretende cursar Engenharia Mecânica, vê o programa como uma oportunidade para iniciar sua carreira profissional na área. "Você pode fazer o ensino médio já começando a trabalhar em seguida. Eu achei isso muito bom e quando eu for pra o ensino médio eu já poderei estar ganhando meu próprio dinheiro", imagina.

Foi assistindo aos telejornais, às propagandas do governo na TV e tendo acesso à internet que Samara Aragão, 13, aluna do 8º ano, ficou mais informada sobre reformulação do Ensino Médio. Ela e seu pai - que é pedagogo - acreditam que a reforma será positiva e que vai ajudar muito aos alunos que ainda não decidiram a profissão que pretendem seguir. Ela ainda destaca o MédioTec e seu benefício. "Eu acho bom, porque assim a gente pode decidir o que a gente quer ser. Aquele (aluno) que não quer uma graduação, poderá fazer um curso técnico". Quando questionada sobre a área que pretende seguir, Samara foi rápida e objetiva: "Engenharia Civil".

A remodelação do ensino médio vem com a intenção de dar essa autonomia ao aluno para que ele escolha diferentes trilhas de formação e formação técnica, mas essas transformações tão recentes ainda estão deixando dúvidas no ar, tanto por parte dos discentes como também dos docentes.

Diferente de Sofia, Pedro e Samara, muitos outros alunos ainda estão indecisos quanto à profissão que pretendem exercer no futuro. E esse é um futuro que está bem próximo.

Mas com essa reforma, o que esperar do futuro da educação no Brasil? A pequena Sofia tem a resposta: "Que os estudantes se sintam e estejam mais preparados para seguir a carreira que escolheram. Afinal, vão passar a se dedicar a matérias que englobam suas futuras carreiras, e que passem a ter uma ideia política, já que essa reforma foi discutida nesse meio".

Um desejo geral é que esses novos estudantes possam se adaptar ao novo ensino, assim, desenvolvendo suas habilidades e usufruindo de seus conhecimentos para que possam contribuir ainda mais para o crescimento da nação. Acima de tudo, que o aluno construa seu próprio futuro.
  • Reportagem produzida para o jornal Contexto Repórter com publicação para o dia 06/03/2017.
  • Disciplina: Técnicas de Produção, Reportagem e Redação Jornalística 1, lecionada pela professora Sônia Aguiar, do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Sergipe. 

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